
As experiências como consultora empresarial levou-me a reflexão desse tema por ter vivenciado casos em que algumas decisões que precisavam ser tomadas em um processo de restruturação organizacional eu solicitava os indicadores financeiros da contabilidade para subsidiar os gestores/empresários a tomada de decisão e observava que muitos nunca tinham tratado a contabilidade como um instrumento de tomada de decisão.
As Micros e Pequenas Empresas no contexto Brasileiro
As Micro e Pequenas Empresas desempenham um papel importante na economia brasileira e mundial. No entanto, com a complexidade do ambiente econômico, com o alto nível de complexidade, turbulências e competitividade, observa-se por parte das Micro e Pequenas Empresas – MPEs algumas características do processo de gestão dos negócios que podem acarretar instabilidade no seu cotidiano, podendo comprometer, assim, os resultados, a capacidade de crescimento e sua vantagem competitiva. A necessidade de se adequar às novas exigências do mercado deve ser uma constante para que as micro e pequenas empresas sobrevivam nos dias atuais, pois não há mais espaços para que as empresas sejam gerenciadas de forma intuitiva, é preciso que os gestores comecem a utilizar os sistemas de informações disponíveis na empresa como instrumentos que auxiliam a tomada de decisão de forma mais efic
Neste sentido, os sistemas de informações devem apoiar as decisões dos gestores em todas as fases do processo de gestão, que requerem informações específicas. Assim, a contabilidade, como sistema de informações, caracteriza-se por registrar todas as transações ocorridas nas organizações, constituindo-se num grande “banco de dados”. Seus dados são úteis à administração, além de representarem um instrumento gerencial eficaz para o processo decisório e de controladoria.
Diante do exposto pergunta-se: De que forma os gestores das Micro e Pequenas Empresas utilizam as informações contábeis na tomada de decisões?
Não se pode negar, que as micro e pequenas empresas compõem um setor estratégico da economia brasileira. Tal assertiva é válida, considerando dentre outras variáveis, o número de estabelecimentos existentes, o número de empregos que geram, assim como, a participação de tais empresas, na formação do PIB brasileiro. Por outro lado, pela forma com que se estruturam e que organizam o trabalho e a produção, pode-se inferir que tais especificidades, são determinantes para posicioná-las no mercado que atuam.
“No Brasil, são criados anualmente mais de 1,2 milhão de novos empreendimentos formais. Desse total, mais de 99% são micro e pequenas empresas e Empreendedores Individuais (EI). As micro e pequenas empresas são responsáveis por mais da metade dos empregos com carteira assinada do Brasil”. (SEBRAE, 2011). Assim, com um importante papel estratégico na economia brasileira, seja pela sua contribuição social através dos inúmeros empregos gerados ou pela sua contribuição para a formação do PIB brasileiro, as microempresas têm recebido uma atenção especial do governo, através de políticas que facilitam a formalização bem como alguns benefícios que garantem sua sobrevivência.
Para tanto, a Constituição Federal de1988, no art. 179 regulamenta que: “A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei.”[1]
No intuito de garantir a eficácia constitucional, em 14/12/2006 é publicada a Lei Complementar nº 123 que institui o Estatuto Nacional da Microempresa (ME) e da Empresa de Pequeno Porte (EPP) estabelecendo as normas gerais para essas modalidades. Neste sentido, a Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas tem como diretrizes reduzir os encargos tributários e aumentar os índices de legalização dos negócios através da desburocratização na abertura, criando inclusive a modalidade de microempreendedor individual, de modo a facilitar o acesso ao crédito e estimular o empreendedorismo. LEMES JÚNIOR E PISA (2010, pág. 49) afirmam que “[…] essa lei é importantíssima, porque proporciona a inclusão do microempresário no sistema financeiro.”
Sendo assim, é possível afirmar que uma das grandes razões da mortalidade é a deficiência gerencial do negócio, que está atrelada a falta de capacitação profissional ou de profissional capacitado para o gerenciamento. Nota-se, portanto, que na prática da gestão das micros e pequenas empresas o controle acontece informalmente e em muitos casos continua sendo informal à medida que a empresa vai crescendo. Relativamente, nas micro e pequenas empresas, há controles deficientes e falta de informações úteis à tomada de decisão.
Sistema de informação para a tomada de decisão
A informação é essencial para a tomada de decisão e sem ela não tem como ter uma Administração eficaz. Para CAUTELA E POLLONI (2000) “informação é a transformação do conhecimento. GIL (2004), “considera dado como matéria prima e informação como produto final”. “Entretanto, para que sejam utilizadas de forma eficaz pelo tomador de decisão e possam ser consideradas como um recurso estratégico, as informações devem ser geradas a partir das necessidades do usuário e serem comparativas, confiáveis, econômicas, com periodicidade certa e detalhamento adequado. Assim, mais dinâmica será uma empresa quanto melhores e mais adequadas forem as informações de que os gerentes dispõem para as suas tomadas de decisão.
O processo de gestão constitui-se num processo decisório. Decisões requerem informações. Os sistemas de informações devem apoiar as decisões dos gestores em todas as fases do processo de gestão, que requerem informações específicas e confiáveis.
Destaca-se a importância dos sistemas de informação para a tomada de decisão em decorrência de que o sistema tem como objetivo apresentar o fluxo de informação e estabelecer vinculações com o processo decisório na organização.
Nesse contexto, entende-se como um sistema de informação o conjunto de subsistemas inter-relacionados que coleta, processa, armazena, transforma e distribui informações para fins de planejamento, tomada de decisões e controle.
A contabilidade como sistema de informação
IUDICIBUS (2010) afirma que:
A contabilidade na qualidade de ciência social aplicada, com metodologia especialmente concebida para captar, registrar, acumular, resumir e interpretar os fenômenos que afetam situações patrimoniais, financeiras e econômicas de qualquer ente, seja de pessoa física, entidade de finalidade não lucrativa […] (p.1)
LOPES DE SÁ (2010, p.46) define a contabilidade do seguinte modo: “a Contabilidade é a ciência que estuda os fenômenos patrimoniais, preocupando-se com realidades, evidências e comportamentos dos mesmos, em relação a eficácia funcional das células sociais”.
Afirma MARION (2012, p. 28) que a Contabilidade é o grande instrumento que auxilia a administração a tomar decisões. Na verdade, ela coleta todos os dados econômicos, mensurando-os monetariamente, registrando-os e sumarizando-os em forma de relatórios ou de comunicados, que contribuem sobremaneira para a tomada de decisões.
“A respeito da informação contábil, ela deve ser dinâmica e, com isto, atender às rápidas transformações das estratégias organizacionais em função das modificações dos cenários. A Contabilidade, pois, deve ser preditiva e fornecer informações e não dados. Cada grupo de tomadores de decisão impõe limites referentes à informação necessária as suas decisões, que condicionarão a seleção dos dados de entrada” (MISIMANN;FISCH, 2002). A questão da utilização das informações contábeis no processo de tomada de decisão vem sendo alvo de atenção por parte das organizações, sendo cada vez maior o número de empresas que estão percebendo que sem uma boa contabilidade, não há dados para a tomada de decisão.
Destaca-se, que a partir das informações levantadas, elaboradas e fornecidas pela contabilidade, a administração da empresa – através de técnicas como as de análise e interpretação de balanços, auditoria, contabilidade de custos e controladoria – pode tomar decisões quanto a investimentos, financiamentos, pagamento das obrigações, momento de substituição de ativos obsoletos (como máquinas, por exemplo), nível ideal de estoque, entre outras.
“Um dos objetivos da contabilidade é fornecer informações sobre as mutações que ocorrem com o patrimônio das empresas. Entretanto, muitos consideram a Ciência Contábil como mero instrumento de informação, quando na verdade todas as áreas do conhecimento geram informações. A contabilidade, além de gerar informações, permite explicar os fenômenos patrimoniais, construir modelos de prosperidade, efetuar análises, controlar, e também serve para prever e projetar exercícios seguintes, entre tantas outras funções”. (OLIVEIRA, MULLER, NAKAMURA 2000).
A contabilidade como instrumento de tomada de decisão para as micro e pequenas empresas
“A contabilidade é a linguagem dos negócios. Mede os resultados das empresas, avalia o desempenho dos negócios, dando diretrizes para tomadas de decisões”. (MARION, 2012, p. 26) […] Vivemos em um mundo em que “aplicar os recursos escassos disponíveis com a máxima eficiência” tornou- se, dadas às dificuldades econômicas, uma tarefa nada fácil. A experiência e o feeling do administrador não são mais fatores decisivos no quadro atual; exige-se um elenco e informações reais, norteiem tais decisões. E essas informações estão contidas nos relatórios elaborados pela Contabilidade. Segundo autor, a função básica do contador é produzir informações uteis aos empresários e pode ser considerado como sistema de informação destinado a ajuda-los na tomada de decisão. O objetivo principal da contabilidade, portanto, é o de permitir a avaliação da situação econômica e financeira da empresa, num sentido estático, bem como fazer inferência sobre suas tendências futuras.
Sabe-se que uma das características das Micros e Pequenas Empresa está relacionada ao modelo de gestão do negócio. A falta de conhecimento de técnicas empresariais, de conhecimento em gestão, dificulta às vezes tomadas de decisões mais eficazes.
Outro aspecto observado pelas pesquisas referente as características as Micros e Pequenas Empresas é que, muitas vezes, não possuem suporte necessário para utilizar os dados fornecidos pela Contabilidade para uma tomada de decisão eficaz. Uma das grandes dificuldades enfrentadas pelos empreendedores se refere à compreensão dos aspectos financeiros e contábeis do negócio. Os autores LONGENECKER, MOORE, PETTY E PALICH (2007):
“vários gestores de pequenas empresas fazem algum tipo de planejamento, mas, em geral, planejam menos do que seria ideal […] também evidenciam que “a maioria das empresas poderia obter mais lucro se aumentasse o planejamento feito pelos gestores e se planejasse de modo mais sistemático”. (p. 333)
“Há uma grande quantidade de informação disponível nos mais diferentes meios (jornais, revistas, rádio, televisão, bibliotecas, internet etc.). Essas informações, quando úteis e aplicáveis, geram conhecimento dentro da empresa, o que é fundamental para a inovação de produtos, serviços, processos, marketing e organizacional”. (SEBRAE, 2015).
As informações geradas pela Contabilidade não apenas as de caráter legal, fiscal e burocrático, para que tenham relevância no processo de gestão das pequenas empresas, devem propiciar aos seus clientes empresários, base segura para as suas decisões de cunho estratégico para o negócio, respeitando as especificidades de cada empresa. Além disso, as características das informações contábeis, para torná-las mais úteis aos proprietários das micro e pequenas empresas, precisam estar pautadas na transparência, evidenciação, confiabilidade, relevância, direção (orientação), simplicidade e objetividade.
Observa-se na prática, mesmo alguns gestores sabendo da necessidade de se ter um acompanhamento profissional especializado no processo de tomada de decisão e na organização dos dados, este é feito de maneira marginalizada, prejudicando assim o melhor desempenho da sua organização.
Destaca-se, portanto, que a contabilidade como um sistema de informação é uma ferramenta indispensável para a gestão de negócios das Micros e Pequenas Empresas, que não deve ser vista apenas como um processo para fins tributários, mas como um instrumento que subsidia a tomada de decisão.
Considerações Finais
O presente artigo objetivou apresentar uma reflexão sobre a contabilidade como um sistema de informação e instrumento de tomada de decisão para as Micro e Pequenas Empresas.
É incontestável a importância das informações contábeis para a gestão de qualquer empreendimento empresarial. Nota-se, que muito das vezes, o empresário, na maioria dos casos, não possui conhecimentos contábeis suficientes e, por vezes, não consegue sequer avaliar sua importância, bem como, mesmo alguns gestores sabendo da necessidade de se ter um acompanhamento profissional especializado, no processo de tomada de decisão e na organização dos dados, este é feito de maneira marginalizada, prejudicando assim o melhor desempenho da sua organização.
Por isso, cabe ao contador estreitar a aproximação, participar e conhecer mais a vida empresarial de seus clientes e demonstrar com convicção a relevância da contabilidade como instrumento de tomada de decisão estratégica para os negócios.
REFERÊNCIAS
CAUTELA, Alciney Lourenço; POLLONI, Enrico Giulio Franco. Sistemas de informação. Rio de Janeiro: McGrawHill, 2000.
GIL, Antônio de Loureiro. Sistemas de informações contábil / financeiros. São Paulo: Atlas, 2004.
LEMES JUNIOR, A. B.; PISA, B. J. Administrando micro e pequenas empresas. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.
LONGENECKER, MOORE, PETTY, PALICH, J. G., C. W. J. W; L. E. Administração de Pequenas Empresas. 13ª edição norte-americana, 2007.
MARION, José Carlos. Contabilidade empresarial. 16° ed. São Paulo: Atlas, 2012.
MISIMANN, Clara Pellegrinello; FISCH, Sílvio. Controladoria: seu papel na administração de empresas. São Paulo: Atlas, 2002.
SÁ, Antônio Lopes de. Controladoria e contabilidade aplicada à administração. Curitiba: Juruá, 2009. Disponível em: < www.traca.com.br/livro/ 293109/ contabilidade- para- administradores>. Acessado em 01/10/2016.
SEBRAE, Taxa de Mortalidade das micro e pequenas empresas do Brasil. Relatório de Pesquisa – 2011. Disponível em https://www.sebrae.com.br/Sebrae/Portal%20Sebrae/Anexos/Sobrevivencia_das_empresas_no_Brasil_2011.pdf. Acessado em 03/10/2020.
SEBRAE (2015), A gestão do conhecimento nos pequenos negócios, Online, 1 (1). Disponível em:
http://www.sebrae.org.br/sites/PortalSebrae/artigos/a-gestao-do-conhecimento-nos-pequenos-negocios,f32926ad18353410VgnVCM1000003b74010aRCRD. Acessado em 03/10/2020.
IUDÍCIBUS, Sérgio de, MARION, José Carlos. Dicionário de termos de contabilidade. São Paulo: Atlas, 2001.
IUDÍCIBUS, Sérgio de. Contabilidade introdutória/ equipe de professores da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP; coordenação Sergio de Iudicibus. —11. ed. – Sao Paulo: Atlas, 2010.
SÁ, Antônio Lopes de. Teoria da Contabilidade. São Paulo: Atlas, 2010
OLIVEIRA, Antônio Gonçalves; MULLER, Aderbal Nicolas; NAKAMURA, Wilson Toshiro. A utilização das informações geradas pelo sistema de informação contábil como subsídio aos processos administrativos nas pequenas empresas. Disponível em:<http://www.fae.edu/publicacoes/pdf/revista_da_fae/fae_v3_n3/a_utilizacao_das_informacoes.pdf>. Acessado em 06/11/2016.
[1] Constituição Federal do Brasil de 1988.