Já tem tempo que falo nas aulas, palestras e eventos sobre as oportunidades geradas pelo comércio exterior; da relevância da cultura exportadora na gestão de empresas brasileiras; do essencial papel do comércio exterior na economia, na geração de emprego, renda, melhoria da qualidade de vida e oportunidades globais. Por isso, os dados estatísticos e financeiros do comércio exterior são relevantes para direcionar a estratégia de globalização de uma empresa e merecem atenção.
Nesse sentido, pode-se observar potenciais mercados considerando, por exemplo, os dados da balança comercial brasileira que tem expectativa de fechar 2023 com superávit de US$ 86,4 bilhões, o que representaria aumento de 40,5% em relação a 2022, segundo estimativas da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).
Dados recentes da Balança Comercial, publicados pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) mostram que no acumulado Janeiro até 3ºSemana de agosto/2023, em comparação a janeiro/agosto 2022, as exportações cresceram 0,7% e somaram US$ 214,05 bilhões. As importações caíram -10,1% e totalizaram US$ 153,90 bilhões. Como consequência destes resultados, a balança comercial apresentou superávit de US$ 60,14 bilhões, com crescimento de 45,3%, e a corrente de comércio registrou queda de -4,2%, atingindo US$ 367,95 bilhões.
Entre os produtos de maior participação nas exportações estão a soja, o milho não moído, café não torrado, algodão, minério de ferro, carne bovina e celulose, entre outros do setor agropecuário, da indústria extrativista e de transformação.
Mas, esses números são de comemoração?
A vocação exportadora do Brasil são as commodities. Foi assim desde sempre e não há uma política clara de comércio exterior, ao menos em minha visão, que possa incentivar a pequena e média empresa a direcionar seu pensamento estratégico para o mercado global, principalmente para a exportação de seus produtos e serviços e, assim, diversificar a pauta de exportação brasileira.
Então, a balança comercial seguirá alicerçada em produtos agrícolas, agropecuários e produtos minerais enquanto as importações são de produtos manufaturados.
Números a parte, os cenários macroeconômicos global e interno em 2023 trazem ainda alguns desafios:
- O combate à inflação faz com que os bancos centrais adotem posturas mais firmes;
- A desaceleração de mercados importantes como, por exemplo, a China que atraiu os olhares do mundo depois de abandonar as duras regras de combate à Covid que, embora tenha apresentado um crescimento no primeiro trimestre de 2023, ainda merece atenção ao seu potencial de crescimento pós-covid, assim como a desaceleração do mercado americano e Zona do Euro;
- Alta de taxas de juros, incluindo o Brasil;
- Adotar de fato, medidas que elevem o nível de confiança do país;
- Reforma tributária no Brasil;
- Agenda ambiental e questões climáticas.
Esses desafios têm reflexos na corrente de comércio Brasil e seus parceiros comerciais e não são desafios de agora. Em uma rápida análise de 2021 até aqui, identifica-se que na pandemia se viu um colapso na cadeia de abastecimento global, seguido de um período de retomada de demanda, mas muito dessa retomada foi demanda reprimida. Houve um período de escassez de insumos, uma confusão logística sem precedente com elevação de preço de frete, falta de containers e de navios, congestionamento em portos no mundo todos, guerra Rússia x Ucrânia causando impactos no fornecimento de comodities agrícolas e petróleo, apreensão com a recessão do mercado americano e alta de juros inclusive na Europa. Tudo isso, impactando nos preços dos alimentos mundo a fora, setor em que somos referência quando assunto é exportação.
No cenário global, o mundo é condicionado pela continuidade das mudanças e essa continuidade tornou-se habitual e não se trata mais de uma simples situação de crise encaixotada entre dois momentos de estabilidade. Então, penso que é passada a hora de rever essa dependência brasileira de sustentar a balança comercial com base nas commodities. O planejamento estratégico de internacionalização deveria ser parte da lição de casa do empresário brasileiro, ou seja, é preciso mudar a cultura do comércio exterior.
E as mudanças sempre aconteceram. Basta lembrar a crise financeira em 2008 nos Estados Unidos, causada pelo aumento de valores imobiliários com reflexos no mundo todo, época aliás que a Balança Comercial brasileira apresentava queda no superávit e as importações cresciam em relação às exportações enquanto o BNDES analisava o reflexo da mudança de preços das commodities na deterioração do saldo da balança comercial.
E se não fosse o Brasil tão dependente de commodities?
Mudando a cultura é possível diversificar mercado e produtos, fortalecer uma marca e um nome no exterior e ainda dar ao empresário, principalmente ao pequeno e médio, a oportunidade de não ser refém do mercado doméstico. Se isso, de fato, fosse prioridade, os números do comércio exterior mudariam de forma a permitir uma participação brasileira no comércio global acima dos insignificantes 1% que temos atualmente, contribuindo ainda mais com a balança comercial.
Nesse cenário e frente aos desafios listados acima e tantos outros, deveria haver um diálogo entre empresas e governo, procurando destruir de vez o pensamento equivocado de que o comércio exterior é apenas para grandes empresas, pensamento que é uma bobagem e, principalmente, quebrar o paradigma que ainda existe de que comércio exterior é um bicho papão, outra bobagem. Por outro lado, o diálogo poderia se dar ainda em desenvolver mecanismos de incentivo à exportação voltado a PME, responsáveis por gerar emprego e renda.
Não existe economia sem comércio exterior. Todo país importa e exporta, é hora de valorizar nossa atuação global e trabalhar em prol do desenvolvimento de uma nova cultura de exportação, a de ofertar produtos e serviços com valor agregado por meio de ferramentas que capacitam e soluções que possam inspirar empresas a se tornarem globais.
Prof. Marco Antonio da Silva – É CEO do Grupo Comex Online, Administrador e Especialista em Gestão de Negócios Internacionais, coordena o Curso MBA Gestão de Comércio Exterior na BSSP Centro Educacional, é professor no MBA em Gestão Tributária na Esalq/USP, é consultor de Negócios Internacionais do SENAC, autor de livros, palestrante e realiza há mais de 35 anos negócios globais envolvendo a importação e a exportação.