A fim de demonstrar, parcialmente, esta influência, realizou-se um estudo, dentro de uma amostra de 15 (quinze) empresas de diferentes ramos e formas de tributação localizadas no Oeste de Santa Catarina, sobre os fatores que influenciam de forma positiva e negativa o cadastro de produto de cada uma delas.
Avaliou-se quais os elementos deveriam ser ajustados dentro dos processos internos das empresas para atingir êxito no cadastro de produtos e atender as demandas apresentadas pela legislação, comprovando-se que através da Conformidade fiscal é possível diminuir consideravelmente os riscos tributários.
De acordo com Prof.Crepaldi, Os problemas de controle interno encontram-se em todas as áreas das empresas modernas. Como exemplo disso podem-se citar: vendas, fabricação, compras, tesouraria etc. Quando exercido adequadamente sobre cada uma das funções acima, o controle assume fundamental importância, objetivando atingir os resultados mais favoráveis com menores desperdícios[1].
Ainda neste sentido, as organizações precisam observar com mais atenção alguns processos, a exemplo dos cadastros de produtos.
É claro que o conceito de Conformidade fiscal não se limita a instaurar processos eficientes de cadastro de produtos, entretanto trata-se do início de uma sequência de informações tributárias essenciais para a correta apuração dos tributos.
Os colaboradores ou prestadores de serviços responsáveis por desempenharem esta atividade devem estar treinados e preocupados em validar as informações gerando conformidade e consequente confiabilidade aos registros. A conscientização de sua função e da importância na composição dos valores que guiam a empresa são fundamentais para o envolvimento destes colaboradores. Somente desta forma entende-se possível uma mudança de cultura que garanta o cumprimento da legislação e das políticas internas da empresa.
Estruturar um sistema de informação[2] é essencial para dar mais agilidade e credibilidade ao processo de cadastro garantindo menos falhas e melhores resultados.
Como bem destacou Silva e Covac, quando uma instituição está? em conformidade (compliance), ela dissemina a ética, mitiga riscos, age com transparência, monitora seus colaboradores e clientes, e comunica as faltas de conformidade as autoridades competentes, contribuindo para o bom funcionamento do sistema e evitando sua utilização em fraudes ou outras inconformidades[3].
Pela observação da amostra analisada conclui-se que o colaborador responsavél pelo cadastro de produto, normalmente, não tem conhecimento específico sobre tributação, tampouco domínio sobre todas as ferramentas disponibilizadas no sistema. Destaque-se, um projeto eficiente de compliance deve envolver a alta administração, criar um código de ética e conduta, prever comunicação e treinamento contínuos para que esse código se torne um mantra corporativo, e ainda desenvolver mecanismos e controles para detectar e evitar desvios, fraudes e atos ilícitos. É importante também que estabeleça canais de denúncia e meios para atestar a idoneidade de fornecedores e parceiros de negócios[4].
Segundo Prof. Crepaldi, quando é elaborado o plano de organização, é de importância vital que o pessoal compreenda claramente suas funções e responsabilidades, sendo conveniente, para tanto, que exista normas de procedimentos devidamente documentadas[5].
A partir do momento que a organização tem os seus controles internos definidos diminui os risco de informações equivocadas e evita possíveis fraudes.
1. Metodologia de pesquisa
Para atender ao objetivo proposto pelo estudo, realizou-se uma investigação essencialmente qualitativa[6] por meio de um levantamento de dados. A amostra da pesquisa compreendeu empresas da região oeste do estado de Santa Catarina com diferentes ramos de atuação e regime de tributação. O delineamento deu-se a partir da quantidade de retorno dos questionários enviados, totalizando 15 (quinze) respondentes.
O questionário foi enviado aos responsáveis pelo cadastro dos produtos em cada empresa utilizando-se da plataforma google forms, e os dados obtidos devidamente tabulados.
O instrumento de pesquisa utilizado foi estruturado com apenas uma questão objetiva as demais possibilitavam resposta aberta[7].
1.1 Questionário e apresentação dos resultados
1) Qual o Regime de Tributação da Indústria?
Dentre o universo pesquisado, 60% das empresas são tributadas pelo Lucro Real e 20% pelo Lucro Presumido. É justamente nestas empresas que o cadastro de produtos influência mais significativamente na apuração dos tributos. Para empresas do Simples Nacional, 20%, o impacto do cadastro de produtos é menor, o que não justifica o descuido nesse quesito.
2) Qual o ramo de atuação da Indústria?
Optou-se pela escolha de variados setores industriais – apenas um segmento se repete. A diversidade do universo pesquisado é interessante para o entendimento do tratamento dado ao cadastro de produtos independente do ramo de atuação. Participaram do estudo empresas dos seguintes ramos de atividade : Fabricação de equipamentos de informática; Frigorífico; Gráfica; Metalúgica; Laticínio; Indústria e Comércio de Enzimas; Fabricação de produtos de padaria e confeitaria com predominância de produção própria; Fabricação de produtos de limpeza e polimento; Fabricação de máquinas e equipamentos para a agricultura; Fabricação de esquadrias de madeira e de peças de madeira; Fabricação de esquadrias de madeira e de peças de madeira; Fabricação de esquadrias de metal; Fabricação de transformadores; Indústria / Comércio atacadista de outras máquinas e equipamentos.
3) Qual o cargo (ou função) do responsável pelo cadastro dos produtos na empresa?
As respostas apontaram para a conclusão de que os colaboradores responsáveis tem formação generalista. Veja-se:
- 54% tem cargos ou funções administrativas em geral
- 20% tem cargos ou funções ligadas ao setor de compras.
- 14% tem cargos ou funções ligadas as áreas fiscais.
- 6% tem formação em engenharia
- 6% não há colaboradores definidos para efetuar o cadastro.
4) O responsável pelo cadastro dos produtos recebe treinamento?
Das empresas pesquisadas, 67% declararam que os colaboradores recebem treinamento para desempenhar a atividade, enquanto em 33% não recebem treinamento.
5) O responsável pelo cadastro tem conhecimento de tributação?
Ainda que 33% não recebam treinamento (questão 4), 87% declaram que os colaboradores tem conhecimento na área fiscal, o que nos parece incoerente já que 86% dos colaboradores nesta atividade não possuem formação especializada (questão 3).
6) O responsável pelos cadastros dos produtos conhece os campos a serem informados no momento do cadastro, exemplo CFOP, NCM, CST/ CSOSN, CEST?
Não tem conhecimento (básico) sobre os campos a serem informados no momento do cadastro de produtos 13% dos coboradores e 87% conhecem os campos a serem preenchidos.
7) Quais os processos adotados para o cadastro dos produtos na empresa?
Das empresas pesquisadas 73% apresentaram processo definido para cadastro de produtos, 27% não tem processos para esta atividade. Porém, notou-se que os processos demonstrados são incompletos e não observam todas as variáveis que envolvem o cadastro de produtos.
As explicações coletadas através da questão deixam claro que a primeira preocupação é determinar a finalidade do produto para empresa, seja uso e consumo, matéria-prima, imobilizado, entre outras. A segunda está em verificar se o produto já esta cadastrado.
As empresas pesquisadas não descreveram processos de análise e conferência das informações que constam no cadastro, tais como, NCM (Nomenclatura Comum do Mercosul), CST (Código de Situação Tributária), CFOP (Código Fiscal de Operações e Prestações das entradas e saídas de mercadorias intermunicipal e interestadual) e as alíquotas dos produtos.
8) Em caso de dúvidas no momento do cadastro, a quem o colaborador recorre?
Em 80% das empresas pesquisadas o apoio é fornecido por escritório de contabilidade e 20% confirmam as informações necessárias internamente.
Embora as empresas declarem (questão 04) que 67% dos colaboradores recebam treinamento, fica evidente a dependência do auxilio do escritório de contabilidade. A falta de processos definidos influenciam para que o colaborador sinta-se inseguro no desempenho da sua função.
9) Os cadastros são revisados?
Mesmo diante da complexidade e das alterações frequentes da legislação, 47% das empresas pesquisadas revelaram que não revisam seus cadastros. Uma porcentagem pequena, 6%, revisam anualmente e os outros 47% preocupam-se com a revisão constante.
10) Quais as dificuldades no momento de fazer o cadastro de produto?
A pesquisa revelou que em 53,33% das empresas, os colaboradores apresentam dificuldades para classificar o produto no NCM em razão das descrições inexatas e de identificar o CST. Pouco menos da metade, 46,67%, não apresentaram dificuldades.
11) A empresa já sofreu alguma autuação por parte do fisco, com problemas desencadeados através de um cadastro preenchido de forma indevida?
As empresas pesquisadas não sofreram nenhuma autuação originada, essencialmente, por cadastros incorretos. Eventual tributação a maior, em razão de erros no cadastro, não foi objeto do estudo.
2. Conclusão
Em maioria, o colaborador que desempenha a atividade de cadastro de produtos faz parte de setores administrativos (não é especialista na área tributária e não tem um perfil definido pelo gestor), recebem treinamento e tem conhecimento sobre tributação. Diante disso, restou-se controverso a dependência de validações externas de escritórios de contabilidade, a não adoção de processos detalhados e a disciplicência na revisão constante dos cadastros.
Colaboradores com conhecimentos na área fiscal (87%) e devidamente treinados (67%) deveriam recorrer com menos frequência a fontes de consulta externas (escritórios de contabilidade) e atentarem-se a importância de se ter processos bem delineados e revisados frequentemente.
Percebe-se uma crença dos gestores e dos colaboradores de que há controles suficientes no cadastro de produtos, provavelmente em razão da ausência de autuações fiscais. O conceito de risco está intimamente ligado a questionamentos das autoridades fiscais. Não se leva em consideração eventuais prejuizos financeiros com recolhimentos a maior dos tributos.
Esta falha acaba gerando oportunidades/demandas para escritórios de advocacia e consultorias especializadas em levantamentos de créditos tributários.
Na bibliografia sobre o tema encontram-se recursos para transformar o cadastro de produtos em um processo simples, porém seguro, considerando todos os detalhes de cada atividade. Entretanto, todos devem ter em mente que nenhum programa de Compliance é ótimo em todos os sentidos. O seu maior desafio é não impactar a produtividade das empresas, com o ônus da demora nos processos[8].
A implementação de programas de Conformidade fiscal exige a incorporação de práticas éticas e transparentes em sua gestão. O maior desafio é firmar este compromisso, fundamentalmente com direção da empresa que, consequentemente engajará seus colaboradores.
[1] Silvio Aparecido Crepaldi, Guilherme Simões Crepaldi – Auditoria Contábil – Teoria e prática – 10º Edição.
[2] Sistema é um conjunto de elementos interdependentes, ou partes que interagem formando um todo unitário e complexo. PADOVEZE (2012:22, apud SANTOS, 2015:30),
[3] SILVA, COVAC. Daniel e José. Compliance como boa prática de gestão de ensino superior. São Paulo: Saraiva, 2015.
[4]http://estudio.folha.uol.com.br/petrobras/2017/06/1892322-mais-empresas-adotam-praticas-de-compliance.shtml
[5]CREPALDI. Silvio Aparecido, Guilherme Simões. Auditoria Contábil: teoria e prática. São Paulo: Atlas, 2017.
[6] Esse tipo de pesquisa se fundamenta na discussão da ligação e correlação de dados interpessoais, na coparticipação das situações dos informantes, analisados a partir da significação que estes dão aos seus atos. Na pesquisa qualitativa, a verdade não se comprova numérica ou estatisticamente, mas convence na forma de experimentação empírica, a partir de análise feita de forma detalhada, abrangente, consistente e coerente. MICHEL, Maria Helena. Metodologia e pesquisa científica em ciências sociais. 2. Ed. São Paulo: Atlas, 2009.
[7] As chamadas perguntas abertas são aquelas que, dentro do seu questionário, exigem uma resposta em formato de uma frase ou texto elaborado com as próprias palavras do respondente. Nesse tipo de questão, o entrevistado tem liberdade para explicar, descrever e opinar sobre seu questionamento, de forma mais ampla e pessoal do que com respostas pré-definidas pelo questionário.(https://blog.opinionbox.com/perguntas-abertas-usar-ou-nao-na-sua-pesquisa-de-mercado/)
[8] https://gfsa.com.br/noticias/detalhes/65/Empresas-intensificam-busca-por-compliance-ap%C3%B3s-casos-de-corrup%C3%A7%C3%A3o
Por Bruna Grisa Basso
e Claudia Marchetti
Advogada, mestre em Direito Constitucional e Doutoranda em Direito Fiscal pela Universidade de Lisboa. Professora da BSSP Centro Educacional.