A Lei Anticorrupção (12.846/2013), em seu artigo 2º, instituiu a responsabilidade objetiva da empresa, sem necessidade de comprovação de dolo ou culpa, o que possibilita a implicação do empresário por ato ilícito cometido por seus funcionários. Anteriormente, a empresa poderia deixar de ser punida, alegando tratar-se de ato isolado de funcionário ou servidor público, pela dificuldade de apuração.
Quanto ao cumprimento das exigências legais e suas obrigações acessórias, os empresários têm como pano de fundo o projeto Sped (Sistema Público de Escrituração Digital), instituído pelo Decreto nº 6022/2007, com o objetivo de implantar novos processos, através do uso intensivo da tecnologia da informação. Em decorrência, os Fiscos (federal, estadual e municipal) passaram a ser integrados, tornando a fiscalização mais assertiva e a identificação de ilícitos tributários rápida.
Nesse contexto, o cumprimento de regras legais ou regulatórias deixa de ser uma opção e passa a ser uma obrigação para assegurar tanto a permanência da empresa no mercado quanto a preservação da sua imagem. Isso demanda a implantação de um programa de compliance com diversas abordagens: trabalhista, contábil, fiscal, ambiental, jurídica, previdenciária, financeira, ética, entre outras, que garantam integridade e bons resultados.
De forma resumida, o compliance tem como finalidade promover: o cumprimento efetivo de regras internas e externas; a utilização eficiente e eficaz de todos os recursos; e, com isso, ele ajuda a mitigar a ocorrência de riscos (operacionais e legais). O grande desafio, no entanto, é preparar pessoas para absorver todas as inovações em termos de tecnologia e de legislações cada vez mais rigorosas em relação ao cumprimento das obrigações.
É a área de gestão de pessoas que se apresenta com um papel fundamental para viabilizar as mudanças necessárias no perfil dos profissionais que atuam nas empresas. Além disso, tal área será responsável pela implementação de um programa de conformidade, bem como pelo monitoramento de seu cumprimento.
Como fazer uma boa gestão de pessoas
Inicialmente, precisamos entender a diferença básica entre gestão de pessoas e gestão de Recursos Humanos (RH). A gestão de RH envolve atividades mais técnicas e mecânicas: recrutamento, seleção, remuneração e desligamento de funcionários. A gestão de pessoas tem como principal preocupação o desenvolvimento e a valorização do profissional como ser humano exercendo a sua atividade na empresa. E é dela o grande desafio neste momento: preparar as pessoas para absorver a quantidade e a qualidade de inovações, principalmente tecnológicas, que estão sendo geradas.
A base para que os objetivos sejam atingidos e as regras de controles sejam cumpridas passa pelas pessoas, em todas as áreas da organização. É a área de gestão de pessoas quem vai traduzir os códigos de conduta aos colaboradores, capacitando-os para que estejam alinhados com os mesmos valores da organização. Isso começa no processo de recrutamento e seleção, ao buscar pessoas íntegras e com o perfil da vaga e da empresa. Em seguida, é necessário divulgar as políticas de compliance que deverão ser cumpridas, exigindo o comprometimento de todos, e comunicando as sanções previstas em caso de violação.
Muitas vezes o desconhecimento das regras, ou a não aceitação das mesmas, aliado à falta de treinamento e orientação constante, pode fazer com que um caminho errado seja seguido, comprometendo o resultado esperado e gerando expressivos passivos, principalmente trabalhistas.
Além disso, estar em conformidade diz respeito também à desaprovação de condutas discriminatórias, assédio moral e processual, corrupção, condutas antissindicais e relacionamentos entre gestores e colaboradores. O que demanda mecanismos de prevenção para evitar a exposição da empresa, bem como sua responsabilização.
A implementação de ações de compliance através da gestão de pessoas deve abranger as seguintes áreas:
• Ética organizacional – todos devem atuar em conformidade com o Código de Ética, definido através de um conjunto de procedimentos a ser cumprido por todos na organização.
• Comunicação – mecanismos de divulgação adequados a cada tipo de público, para divulgar as ações necessárias para cumprimento do Código de Ética e as punições previstas em caso de condutas inadequadas.
• Treinamento – ações de capacitação para sensibilizar, orientar e desenvolver os empregados.
• Canais de denúncia – para viabilizar a comunicação direta do público interno ou externo, podendo informar condutas inadequadas, reclamações, alegações ou sugestões, visando ao cumprimento das regras e à melhoria contínua dos processos.
• Conflitos de interesses – definição de procedimentos para orientar a todos quanto a situações que possam gerar conflitos de interesse, alinhados com as regras da organização.
• Monitoramento – ações de avaliação contínua do cumprimento das regras, evidenciação de novas áreas de risco e estabelecimento de novo conjunto de políticas e procedimentos para mitigá-las.
Em se tratando das questões trabalhistas, é importante mapear todas as rotinas ligadas ao cumprimento da legislação trabalhista: admissão, cargos e salários, obrigações sociais, treinamento e desenvolvimento profissional, sistema de gestão de pessoas, desligamento, entre outras. Com isso, é possível identificar os requisitos que devem ser cumpridos em cada uma delas; os riscos associados à ausência de conformidade; quais os desdobramentos necessários na rotina de verificação de conformidade; e quais os planos de ação para melhoria.
Um programa de compliance que defina o conjunto de políticas e procedimentos que reduzirão os riscos do não atendimento às exigências legais, bem como o atingimento dos objetivos da empresa; e da área de gestão de pessoas é a principal ferramenta para implantação e disseminação das políticas, bem como do monitoramento do cumprimento efetivo.