O Sistema Público de Escrituração Digital (Sped), instituído pelo Decreto 6.022 em janeiro de 2007, teve como principal objetivo estabelecer um novo método de relacionamento entre a administração pública e os contribuintes. Utilizando-se de tecnologia – responsável por mecanismos de acesso e controle (enforcement) sobre as informações dos contribuintes – para garantir uma fiscalização mais abrangente, mais assertiva, além de gerar maior arrecadação tributária em menor tempo e, principalmente, reduzir o “custo Brasil”.
O desenvolvimento e a implantação do Sped não têm enfrentado grandes dificuldades. Entretanto, o Sistema Tributário Brasileiro possui, além das múltiplas competências e dos inúmeros tributos que precisam ser administrados, uma vasta malha de atos legais emitidos em todo momento e que impactam diretamente o desenvolvimento sustentável de um projeto como o Sped. Segundo o IBPT (2013), desde a promulgação da Carta Magna de 1988 foi editada uma média de 30 normas tributárias a cada dia (ou 1,25 a cada hora).
Atualizar-se frente a este volume de alterações legais ainda é difícil e custoso, pois geralmente é feito por pessoas e não sistemas, o que torna o processo mais suscetível a erros. Nesse sentido, o desenvolvimento do Sped não trouxe mudanças significativas, sendo ele próprio mais um mecanismo de publicação de normas. Como exemplo, a Instrução Normativa nº 787, de 19 de novembro de 2007, instituidora da Escrituração Contábil Digital, sofreu, em apenas cinco anos de existência, mais de seis alterações legais diretas, enquanto a Escrituração Fiscal Digital do ICMS e do IPI, no mesmo período, teve mais de 32 alterações legais diretas.
Qual o custo para o contribuinte?
Os custos de conformidade, na concepção de Cedric Sandford no artigo “Administrative and Compliance Costs of Taxation” (1989), podem ser classificados como monetários diretos, temporais e psicológicos:
- Custos monetários diretos – estão relacionados à contratação ou qualificação de profissionais que apoiem na elaboração e entrega de obrigações tributárias acessórias, mesmo que sejam recursos externos;
- Custos psicológicos – correspondem ao estado de ansiedade dos contribuintes ao cumprir disposições tributárias complexas, imaginando que possam ser intimados a prestar esclarecimentos.
Há ainda a distinção entre custos temporários e permanentes. Para Sandford, segundo levantamento de Bertolucci: a) são temporários aqueles custos que decorrem de alterações da legislação e que incluem a análise das mudanças – com eventual consulta a escritórios externos de advogados ou auditores -, a tomada de decisões relativas, o treinamento do pessoal, a compra de ativos e softwares necessários ao cumprimento das novas atividades e à fase de treinamento, com níveis de produtividade inferiores aos que serão atingidos quando a rotina já estiver implantada; b) são permanentes os custos que se mantêm depois que as rotinas foram incorporadas à cultura da entidade e foi atingido o nível de eficiência adequado.
Um dos estudos nacionais amplamente referenciado foi desenvolvido por Bertolucci & Nascimento, e publicado na Revista Contabilidade & Finanças (2002). Os autores argumentam que “os custos de conformidade são fortemente regressivos, penalizando muito mais as empresas menores”. O estudo avalia que as empresas menores, com receita bruta de até R$ 100 milhões/ano, têm uma incidência de 1,66% dos custos de conformidade em relação à receita operacional bruta, o que se estenderia a 5,82% do PIB. Embora a pesquisa já tenha mais de dez anos, a prática profissional permite inferir que esse cenário pode ser ainda pior nesta segunda década do século XXI.
De acordo com dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 1º de março de 2013, o PIB brasileiro de 2012 cresceu 0,9% em relação ao ano anterior. Um crescimento econômico relativamente fraco, ficando abaixo dos 2,7%, de 2011. Em valores correntes, o PIB brasileiro atingiu R$ 4,403 trilhões. Tendo por base a métrica encontrada nos estudos de Bertolucci (2001), somente em 2012, aproximadamente R$ 66 bilhões do PIB foram desperdiçados com os custos de conformidade.
A complexidade e custos de conformidade e os trade-offs deveriam sensibilizar os formuladores de políticas públicas, estimulando-os na busca pelo ponto de equilíbrio dos benefícios esperados com o projeto Sped. Isso é necessário antes de se efetuar uma reforma mais ampla no próprio ordenamento tributário existente, cujo processo de consolidação e revisão sequer foi iniciado ou, pelo menos, não tem obtido o mesmo destaque.
Para saber mais e ver os resultados da pesquisa realizada com empresas brasileiras, leia o artigo científico sob o tema “Contribution to the analysis of the reducing costs of tax compliance and investments in public system of bookkeeping digital – SPED in Brazil”, publicado no JISTEM – Journal of Information Systems and Technology Management – Revista de Gestão da Tecnologia e Sistemas de Informação, vol. 13, nº 1, jan.- abr. 2016, pp.101-130, ISSN online: 1807-1775- DOI: 10.4301/S1807-17752016000100006.
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2 comentários em “Impacto do Sped nos custos dos contribuintes”
Excelente professor!!
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